sábado, 26 de julho de 2008

Naufrágio do "Hildebrand"

Durante o ano de 2007 e em conversa com vários amigos também mergulhadores surgiu a ideia de efectuar uma pequena pesquisa e reunir alguma informação sobre a história deste barco.
É um local de mergulho largamente conhecido e frequentado, com alguns motivos de interesse, tinha algumas informações dispersas, mas não havia nada escrito que reunisse e compilasse toda essa informação.
Aquilo que começou por ser uma conversa de amigos após um mergulho no local, tornou-se rápidamente em algo mais sério.
Todo o trabalho de pesquisa demorou alguns meses e o resultado foi publicado finalmente na Revista Planeta d'Agua, edição de Novembro de 2007 e pode ser lido e consultado por todos os que quiserem conhecer a história deste barco.
Por motivos de edição da revista, mesmo porque o importante era publicar a história e o que tinha acontecido naquela manhã de Setembro de 1957, ficou por publicar algum do trabalho que foi desenvolvido, como fotos dos mergulhos que foram efectuados quando se recolhia mais algumas informações e algumas fotos da epoca, que gentilmente foram cedidas por algumas entidades para publicação.
A grande mais valia do trabalho e que se tornou tambem a mais valia do artigo foi o relato de uma senhora Inglesa que viajava a bordo no dia do acidente.
Tornámo-nos correspondentes e ainda hoje trocamos algumas informações e ideias de possiveis trabalhos sobre o "Hildebrand", já que em Inglaterra um jornal local se interessou pela história e fez o convite para que fosse publicado a versão inglesa do artigo focando principalmente o relato de Mrs. Ruthie Lockyear.
Durante o trabalho de pesquisa consegui tambem um contacto em Espanha onde após algumas trocas de mails e confirmações se chegou á conclusão que durante os trabalhos de recolha dos destroços do navio, um dos batelões se tinha afundado também no mesmo local.
As fotos e informações que me chegaram através do contacto espanhol explicam talvez algumas das observações efectuadas em determinadas areas e alguns objectos que se têm encontrado ao longo dos tempos no local do afundamento.
Esse batelão chamava-se "Luisa", tinha 50 toneladas e afundou a 17 de Junho de 1962.
Trabalhava em conjunto com mais dois barcos, o "España" e o "Puente del Burgo" no desmantelamento, recolha e transporte dos destroços do "Hildebrand" ao serviço de uma empresa de mergulhadores profissionais, a Siebe Gorman.
Na altura do seu afundamento tinha 34 toneladas a bordo e 5 pessoas.
Á parte os danos materiais, com a perda do batelão e da sua carga, todos os cinco tripulantes conseguiram escapar ilesos.

Mergulhar no "Hildebrand"

Hoje, após 50 anos, os trabalhos de recolha e a fúria do mar do local, os destroços existentes são muito poucos.
No entanto ainda se conseguem ver pequenas partes do casco, com as suas cavernas, escotilhas, parte de um mastro, chapas espalhadas por uma área considerável e restos de variado material (ferragens, torneiras, etc.).
A zona é predominantemente areia, com algumas pedras de pequena dimensão na parte mais afastada da costa e á medida que nos aproximamos da costa a quantidade e tamanho dessas rochas vai aumentando.
A "fola" e correntes fortes são bastantes habituais no local, tornando muitas vezes impossível o mergulho.
Por ano, contam-se pelos dedos os dias em que se reúnem as condições óptimas para um mergulho, o que torna um aparente mergulho de baixa profundidade em algo mais complexo e a requerer maior atenção.
A profundidade varia entre os 8 e 11 metros dependendo da maré e do local em que nos encontramos.
A visibilidade, variável e dependente de vários factores, situa-se entre os 2 e os 12 metros, sendo mais provável encontrar cerca de 5 metros com alguma suspensão.
Há dois centros de mergulho a fazerem saídas regulares para o local, ambos bastante conhecedores e experientes no spot.
Como alternativa e nos dias em que isso é possível, pode-se entrar por terra, aproveitando a lage de pedra situada mesmo ao lado do Forte de S. Jacinto em Oitavos.
Com a recuperação do forte, existe até um belo parque de estacionamento para equipar e deixar a viatura enquanto efectuamos o nosso mergulho.
No entanto, a entrada pelas rochas não é fácil. Requer bastante atenção ás condições de mar e trabalho de equipa principalmente depois na saída.
Aliando a estas condições a possibilidade de correntes e mar relativamente forte, a opção de uma saída organizada por um dos centros de mergulho locais é de ter bastante em conta.
Quanto a vida marinha, aproveitando os destroços como recife artificial, abundam as moreias (há um local onde são em numero considerável), safios, polvos, santolas e navalheiras em menor numero, alguns bodiões e fanecas juvenis.
Não existem exemplares grandes, não esquecer que o local também é frequentado por caçadores submarinos, que aproveitam também as facilidades de entrada na água, mas a vida que existe aliada aos destroços ainda visíveis torna o mergulho interessante.
É muitas vezes utilizado também como spot para imersões nocturnas.
Aí, podemos ver os sempre presentes polvos, santolas, chocos, lulas e um ou outro safio pequeno.
Para se usufruir bem desta imersão nocturna é necessário observar e respeitar todos os procedimentos de segurança e fazer-se acompanhar de uma boa lanterna com bastante autonomia.

A "Dinastia" Hildebrand
Hildebrand, nome de origem Nórdica, ligado á mitologia e religião, significa "aquele que persegue o seu objectivo" o que "nunca nega um combate".
O nome forte e confiante de Hildebrand serviu ao longo dos tempos para apadrinhar três navios, distintos e distantes entre si, no tempo e na sua missão.

SMS Hildebrand
Construído para a Marinha Imperial Alemã, fez parte de um conjunto de oito outros barcos, da Classe Siegfried, colocados á disposição entre os anos de 1889 e 1895.
A sua função, tal com os restantes barcos da mesma classe, era a defesa costeira.
Fortemente armado em detrimento da velocidade e autonomia, esteve ao serviço até 1909 na costa Norte da Alemanha ( Nordsee e Ostsee).
Foram-lhe introduzidas grandes alterações que lhe concederam maior autonomia, mas que lhe reduziram algum do poder de fogo que possuía. Depois das alterações, passou a contar com depósitos para 580 tons. de armazenamento de carvão (inicial. 220 tons.)
No início da I Guerra Mundial integrou a Esquadra comandada pelo Contra – Almirante Ekermann.
Em 1916 foram-lhe retiradas as principais armas e serviu como estaleiro na cidade de Windau.
Após ter encalhado na costa Holandesa, em 1919, o que restava do navio foi dinamitado em 1933.
Características:
Ano de Construção: 1890 em Kiel, foi lançado á água em 1892
Dim. Originais: 79 m x 14,9 m x 5,7 m
Após alterações em 1903: 86 m x 14,9 m x 5,4 m
Peso original: 3741 toneladas., após alterações ficou com 4326 toneladas.
Propulsão: 8 caldeiras a vapor, sendo 2 verticais de 3 cilindros cada, com depósitos de tripla expansão, permitindo atingir uma velocidade máxima de 15 nós
Tipo: Navio de defesa costeira
Armamento: 3 peças de artilharia de 24 cm, 10 peças de artilharia de fogo rápido de 8,8 cm, inicialmente contava com 4 tubos lança torpedos passando após 1903 a contar apenas com 3.
Blindagem: entre 180 e 240 mm de aço.
Tripulação: 276 tripulantes, entre oficiais e marinheiros
Datas relevantes:
1890 Construído nos estaleiros de Kiel é lançado á água em 1892 ficando ao serviço como navio de defesa costeira, na costa Norte da Alemanha.
Entre 1899 e 1903 sofre modificações profundas que lhe concedem maior autonomia, retirando-lhe algum poder de fogo.
1914 integra a Esquadra do Contra Almirante Ekermann ficando ao serviço até 1916, altura em que lhe retiram as principais peças de artilharia ficando ao serviço como estaleiro.
1919 encalha na costa Holandesa.
1933 os seus destroços são dinamitados.

SS Hildebrand 2
Este navio de carga e passageiros, construído em Greenock, Escócia fez a viagem inaugural em 1 de Abril de 1911 para a Booth Steamship Company, ligando Liverpool e Manaus, no Brasil.
Durante a I Guerra Mundial serviu o 10º Esquadrão de Cruzadores ao serviço da Marinha Britânica escapando por algumas vezes ao ataque de U-boats Alemães no Atlântico, durante as travessias que efectuou integrando os inúmeros comboios com destino á Europa.
No final da guerra, retornou para o serviço civil, ficando ao serviço da Booth Line para as viagens entre a Grã Bretanha e Manaus, fazendo escala no Porto, Lisboa e Funchal.
Características:
Ano de construção: 1911, Scotts Shipbuilding& Engineering Co, Ltd de Greenock, Escócia
Dimensões: 440,3 x 54,1 x 27,3 pés
Peso: 6995 tonelagem bruta, 4205 tonelagem de frete
Propulsão: Vapor de 2 " x 4 cilindros de 946 nhp ( nominal horse power) atingindo uma velocidade máxima de 12,5 nós.
Tipo: passageiros e carga
Datas relevantes:
1 de Abril de 1911 é feita a sua viagem inaugural entre Liverpool e Manaus, fazendo escala em Le Havre.
5 de Dezembro de 1914 entra ao serviço da Marinha de Guerra Britânica, mudando de nome para HMS Hildebrand, ficando integrado como Cruiser Force "B" do 10º Esquadrão.
2 de Outubro de 1917 o comboio que integra é alvo de ataque de um submarino alemão, que provoca estragos e afundamentos entre alguns dos barcos.
17 de Janeiro de 1917 retorna ao serviço de carreiras da Both Line.
Entre 1922 e 1930 era o único navio de passageiros de 1ª classe a efectuar escalas regulares em Lisboa, Porto e Funchal na viagem que ligava Liverpool a Manaus
19 de Julho de 1932 acaba as suas viagens e aventuras, é enviado para Milford Haven.
Fevereiro de 1934 é vendido por 11.000 £, é desmantelado em Monmouth pela J. Cashmore of Newport.

R.M.S. Hildebrand 3
Navio de linha, construído nos estaleiros da Cammell Laird & Company Ltd, em Birkenhead no ano de 1951.
Fez a sua viagem inaugural no final desse mesmo ano.
Substitui do mesmo construtor e para trabalhar na mesma companhia o navio R.M.S. "Hilary" que serviu com distinção durante a II Guerra Mundial, ao serviço da Marinha Britânica.
O "Hildebrand", maior e mais recente, teve uma existência mais calma, fazendo as suas viagens entre Liverpool e Manaus com escalas em Lisboa e Pará, estado do Belém, Brasil.
Praticamente sete anos após a sua viagem inaugural, encontra o seu fim junto ao forte de Oitavos em Cascais, encalhando num dia de nevoeiro cerrado e mar calmo.
Características:
Construído em 1951 por Cammell Laird & Comapany Ltd, Birkenhead
Dimensões: 439 x 60,3 x 34,6 pés
Peso: 7735 tonelagem bruta, 4368 tonelagem de frete
Propulsão: 2 turbinas a vapor, pressão de trabalho de 490 psi, produzindo 1200 nhp e uma velocidade máxima de 15 nós
Tipo: Navio de linha para passageiros e carga
Datas relevantes:
20 de Julho de 1951 lançado á agua para a companhia Both Line Limited
28 de Dezembro de 1951 viagem inaugural entre Liverpool e Manaus
25 de Setembro de 1957 encalha em Oitavos, Cascais ás 10 horas da manhã devido a cerrado nevoeiro. Não se registam danos pessoais, o que muito ajuda o mar se encontrar anormalmente calmo.
28 de Outubro de 1957 após inúmeras tentativas de soltar o barco das rochas, é dado como perdido, vendido como sucata e desmantelado.
Ficou no local ainda durante alguns anos. A força do mar e dos elementos continuou a destruição iniciada nessa manhã de Setembro.
Após os trabalhos de desmantelamento, ainda hoje são visíveis algumas partes do barco, no fundo.

Esta foi a "dinastia Hildebrand".
Começando num navio de Guerra da Marinha Imperial Alemã, passando por um navio de passageiros que convertido ao esforço de guerra Britânico sobreviveu a inúmeras aventuras na travessia do Atlântico, até ao ultimo, talvez o menos feliz na sua existência, acabando num acidente, dando por terminadas as suas viagens de forma abrupta quando certamente teria ainda muito que navegar.
No final da década de 50, as Companhias aéreas começavam a exercer forte concorrência ás companhias de navegação, mas havia ainda muitos passageiros e principalmente carga cuja escolha recaía na travessia do Atlântico nestes belos e eficientes navios.
Todos eles fizeram justiça ao seu nome!
50 anos após o acidente em Cascais, o "R.M.S. Hildebrand 3" porpociona ainda belos e raros momentos de prazer a quem o pretende visitar, agora, onde repousam alguns dos seus restos.

Os estaleiros da Cammell Laird em Birkenhead

Foi um dos mais importantes construtores navais do sec. XIX e XX.
Deveu-se á junção entre duas empresas: a Laird , Son & Co de Birkenhead e a Johnson Cammell & Co de Sheffield.
O seu fundador, William Laird, iniciou os trabalhos em 1824 tendo-se junto o seu filho quatro anos depois, tornando-se uma empresa em rápida expansão devido ás técnicas inovadoras na construção de navios e das suas propulsões.
A empresa de Charles Cammell, Henry e Thomas Johnson, a Johnson Cammell & Co, produzia toda a espécie de produtos em ferro desde rodas a rails para caminho-de-ferro.
A junção das duas empresas originou a Cammell Laird que entre os anos de 1829 a 1947 construíram mais de 1100 navios de todos os tipos.
A época pós 2ª Guerra Mundial foi muito atribulada para a empresa.
Desde a nacionalização dos seus estaleiros e a sua integração em conjunto com outros fabricantes de navios, até dificuldades financeiras e recessão devido á anulação de alguns contratos, a empresa foi sofrendo de tudo.
O seu historial e palmarés é algo verdadeiramente notável.
Das suas construções saíram milhares de navios, alguns ainda hoje no activo por todo o mundo fazendo parte da Historia Universal.
Os estaleiros em Birkenhead foram vendidos apenas em 2001 e o ultimo navio concluído foi o submarino nuclear H.M.S. Unicorn ( S43 ) no ano de 1993.
A Cammell Laird ainda hoje se dedica á construção, reparação e alteração de navios, agora com sede em Gibraltar.
Nas docas de Birkenhead ainda hoje se pode visitar o submarino H.M.S. Onyx de 1966
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sábado, 19 de julho de 2008

Espírito…de mergulho

"S. Miguel é a maior das ilhas dos Açores…" isto não é novidade, para qualquer pessoa que passou pela escola, ouviu vezes sem conta a professora repetir a mesma afirmação.
Nem sequer foi para comprovar se tinha sido enganado todos estes anos que escolhi esta ilha como a primeira visita que efectuaria a este arquipelago.
Tratou-se mais de uma questão logistica e de opção do que constatar que realmente a D. Antonieta, a minha primeira professora, estava certa e que eu só ao fim de mais de trinta anos é que consegui "tirar a limpo" essa afirmação, muitas vezes repetida de forma...veemente.
O que nunca ninguem me ensinou e que não é ensinado em nenhuma escola é que S. Miguel tem também uma beleza natural espectacular, as pessoas são todas de uma simpatia extraordinaria, a gastronomia é divinal e tem optimos locais de mergulho.
Isto, meus amigos, se fosse ensinado na escola diminuia o insucesso escolar e promovia o que de melhor existe em Portugal.
Mas é algo que não se pode ensinar…tem de obrigatoriamente ser vivido !! Só espero que não guardem trinta e tais anos para o fazer, tal como eu…
Os mergulhos foram muito poucos, para a qualidade verificada logo no primeiro mergulho e que deixava antever que a partir daí seria sempre em crescendo, a verdade é que mesmo mergulhando 24 horas por dia deixaria sempre a mesma sensação : os mergulhos nos Açores são sempre poucos !!!
O Centro escolhido, foi recomendado pelo amigo Carlos Morais o que conhecendo o Carlos e a sua "busca da perfeição" nos bonecos que nos vai habituando, garantia sem margem para qualquer duvida que era a melhor escolha. Antes, claro está, resolvi marcar e telefonar para o Centro de Mergulho Espirito Azul, falando com os dois responsaveis pelo Centro, para avisar das minhas intenções.
Cheguei numa Terça feira ao local onde seria a minha casa nos proximos dias.
Aquilo que reparei logo foi, além da bela vista sobre o mar que o quarto me oferecia, uma coleção de fotografias subaquaticas que existiam no acesso ao restaurante do hotel, representando alguns dos belos exemplares da vida subaquatica da região. Estava definitivamente no local certo !!!
Apesar de não serem dias dedicados exclusivamente ao mergulho, estava já bem envolvido e inspirado.
Aproveitando o convite para jantar do Carlos Morais, pôr a "escrita em dia" em vesperas da sua participação em mais uma competição e após a sua votação da primeira etapa do FotoDigiSub, fui finalmente conhecer o Centro de Mergulho e combinar os pormenores das saidas.
Encontrei um Centro de Mergulho bem organizado, arrumado e limpo, com optimas instalações, onde cada coisa tem o seu local perfeitamente identificado e de forma quase intuitiva.
Do Centro ao local de embarque são pouco mais de 50 metros onde todo o equipamento é transportado por um atrelado, puxado a motor gasoleo, de uma bela carrinha toda decorada e identificada com os logos do Espirito Azul.
O primeiro mergulho seria então no dia seguinte, pela manhã. Estava ansioso, já que o tempo e o mar convidavam a um belo mergulho.


Baixa das Castanhetas

Pontualidade de todo o pessoal, incluíndo os clientes, permitiu que embarcassemos rápidamente, não sem antes ser dado o briefing do mergulho…em 2 linguas !! A nacionalidade dos clientes assim o obrigou.
Trata-se de uma baixa em que o topo se encontra submerso a cerca de 12 metros e desce de forma relativamente acentuada até aos 40 metros.
O plano era seguir o guia por entre as várias elevações e depressões, tendo especial atenção ás reentrancias onde poderiam estar entocados enxaréus e enchovas em epoca de chegada das suas migrações, além da indispensavel atenção aos diversos cardumes que circulariam por cima no azul.
A profundidade máxima era para ser respeitada e não ultrapassar os 20 - 25 metros. Não havia necessidade de descer ao fundo da baixa, porque a verdadeira acção seria na meia agua.
Pessoal e equipamento embarcado, a viagem não demorou mais de 15 minutos passados num ambiente descontraido, onde o Nélio Santos com a sua maneira de ser alegre e extrovertida animou o pessoal a bordo, "picando" e "picante q.b" nas suas loucas intervenções.
O Carlos Paulos seria o skipper enquanto o Nélio Santos seria o guia do grupo. A bordo seguiam mais cinco pessoas, o que permitia um espaço livre consideravel na embarcação.
O combinado era o grupo descer em conjunto, pelo cabo fundeado na baixa. Fui rápido a cair na agua junto com o Nélio e a verificar a bela visibilidade que se encontrava por baixo das nossas barbatanas.
Via-se perfeitamente toda a parte superior da formação rochosa e mais uns bons 20 metros abaixo !! Para inicio estava muito bom assim !!
A descida foi lenta, quase a saborear cada centimetro de descida num azul limpido, de agua a 21º, salpicada por peixes de várias especies.
Seguir o guia era o objectivo e fundamental para quem, como eu, não conhecia nada do local.
Por cima já circulavam algumas Bicudas em cardumes pequenos enquanto em baixo uma pequena garoupa entretinha-me. Procuro novamente o meu buddy e guia que suspenso a meia agua controlava o grupo.
Devido á configuração da baixa, o grupo separa-se ligeiramente, ficando eu com um casal de Espanhois muito simpáticos conhecidos no Centro antes de embarcar, Carlos Viñader e Isabel Hervás, tratados carinhosamente pelo Nélio por "Tios"( leia-se em sotaque Castelhano)...
Passam, entretanto, por cima e relativamente perto um cardume de uma duzia de Atuns, sempre velozes e em perseguição de alimento, abundante naquele local. Vejo o meu buddy desaparecer numa depressão, sendo seguido pelo casal de Espanhois e resolvo subir ligeiramente, encurtando o caminho para me juntar ao resto do grupo.
No fundo da depressão, sendo observado de perto pelo Nélio, um pequeno grupo de Peixe-Rei executa uns movimentos que eu nunca tinha observado, o que me intrigou e levou a aproximar-me mais um pouco.
Para meu azar, a pouca subtileza da minha aproximação estragou o ritual que mais tarde me informaram ser de…acasalamento. Nem sequer tive ocasião de pedir desculpa aos apaixonados peixes…
O Nélio pede então para o informarmos do ar disponivel decorridos que estavam cerca de 30 minutos de mergulho.
Ainda com pouco mais de 120 bar o mergulho ainda duraria e estava guardado o "grande final" deste primeiro mergulho.
Deslocamo-nos entretanto para uma parte um pouco mais funda e ligeiramente fora da pedra, onde se via perfeitamente o fundo da baixa e mantemo-nos ali durante uns segundos.
Do meu lado direito, vindo do fundo, subia majestosamente um enorme Mero. Com perto de um metro de comprimento aproxima-se cautelosamente dos visitantes, chegando perto da nossa profundidade, fazendo-nos acreditar no seu desinteresse com algumas manobras de evasão.
Esconde-se por trás de uma rocha, deixando momentaneamente de o ver.
Resolvo ser eu a tomar a iniciativa, pensando em enganar tão majestoso especime e dar a volta em sentido contrário. Uma especie de "jogo do gato e do rato", entre curiosidade e cautela de ambos…cautela do Mero na aproximação por razões obvias e cautela minha em não estragar tão raro momento.
Quando surjo do lado contrario ao que eu pensava surpreender o Mero, não sei onde se meteu.
Sinto uma presença no meu lado e sou observado a menos de meio metro por enormes olhos, com a barbatana dorsal toda eriçada…O "rato" afinal tinha sido eu…Touché !!!
Mantemo-nos imoveis por breves segundos até á aproximação do resto do grupo.
O companheiro Espanhol resolve então raspar a sua mão na pedra, provocando a obvia reacção do Mero. Aproxima-se rapidamente para investigar encostando-se literalmente ao mergulhador.
Está na hora de terminar este mergulho. O ar rapidamente esgota nestes momentos e dirigimo-nos todos para o cabo.
Subo lentamente observando ainda o fundo e o azul á minha frente.
De realçar que este Mero e muitos outros visitados regularmente pela Espirito Azul não são alimentados á mão. São animais no seu estado selvagem que se aproximam ou não, dependente da sua própria vontade e não condicionados pelas "guloseimas" que muitos mergulhadores levam.
Em conversa após terminar o mergulho, já no Centro, trocámos várias opiniões e conversas sobre o assunto e dos problemas que têm sido detectados em Meros em reservas por esse mundo fora.
Além dos problemas com o excesso de confiança que este comportamento porpociona, com consequencias obvias muitas vezes, têm sido tambem verificados problemas graves de saude em animais devido á sua "dieta".
Quanto a mim, sem querer julgar ninguem, considero que a aproximação e interacção com animais em completo estado selvagem em que a sua vontade não está condicionada á recompensa alimentar, têm muito mais interesse e porpociona momentos unicos de respeito e de fascinio que ficarão para sempre gravados na memória.
Depois deste belo mergulho, estava ansioso por conhecer novos locais e novas experiencias, ficando combinado logo um segundo mergulho para a manhã seguinte...mesma hora, mesmo Centro…local diferente.


Arcos da Caloura

Trata-se de um spot espectacular para quem faz fotografia. Tem inumeros motivos e temas de todos os tamanhos e feitios para entreter o mais exigente dos fotografos subaquáticos.
Além do mais é um mergulho baixo, em que a profundidade não ultrapassa os cerca de 15 metros, sendo também ideal para quem tem pouca experiencia, não obstante a existencia de algumas passagens amplas e sem qualquer perigo para o mais inexperiente dos mergulhadores. Quem por qualquer motivo não se sente bem com estes ambientes pode efectuar o mergulho usufruindo de toda a sua beleza e esplendor sem sequer efectuar as referidas passagens.
Para os demais, o uso de lanterna é fundamental. É a unica forma de comtemplar toda a beleza e vida que existe em cada uma das passagens submersas.
Tal como indica o proprio nome do spot, a formação rochosa é composta por "arcos" que não são mais que amplas passagens feitas na rocha vulcanica com menos de meia duzia de metros de extensão na maior das passagens.
Dentro, o tecto está forrado a cardumes de peixes de várias especies e Espirografos que ondulam na passagem da corrente.
No fundo, normalmente a quererem passar despercebidos rascassos de vários tamanhos tentam fugir e esconder-se cada vez que são descobertos pela nossa iluminação.
É um mergulho que tende a ser longo, por isso não há pressa em observar calmamente e com atenção cada centimetro da formação rochosa. Acreditem que vale a pena !!
Rodeando a formação rochosa principal existem várias outras pedras que merecem a nossa visita. Deixem essa parte para a segunda metade do mergulho, com alguma sorte encontrarão grandes Moreias e timidos Eremitas de bom tamanho.
Fui acompanhado pelo Heitor Melo, aluno formado e cliente das saidas realizadas no Espirito Azul. Seria tambem a sua estreia no local o que nos permitiu uma maior dedicação e atenção á descoberta do local.
Tentámos não perder de vista o resto do grupo onde o Carlos Paulos fazia de guia.
Numa das vezes fomos encontrar o grupo a tentar convencer um Mero a sair do seu buraco, mas acabámos por nos afastar e investigar o que se passava detrás de uma pedra onde surgia uma enorme nuvem de suspensão.
Não era ninguem que inadvertidamente arrastava as barbatanas ou o corpo pelo fundo, pela forma e tipo de nuvem era algo mais localizado e persistente.
Aproximamo-nos lentamente usando a pedra para nos ocultar e permitir ver o que se passava.
No fundo de areia, junto á pedra um Ratão com mais de meio metro de diametro, alimentava-se escavando a areia com as suas "asas", desenterrando e descobrindo o seu alimento.
O Ratão estava tão concentrado na sua tarefa que permitiu a nossa aproximação até cerca de dois palmos de distancia, sem sequer dar pela nossa presença.
Permitiu estarmos ali a observá-lo durante largos segundos, quase com medo de respirarmos e perder o espectaculo.
Após com toda a calma do mundo preparar a maquina fotográfica e tirar a primeira foto, o Ratão levantou ligeiramente a sua barriga do fundo, apenas suspenso pela ponta das "asas", apercebeu-se da nossa intromissão, desviou-se para a direita e nadou para longe.
Foi sem duvida a imagem que melhor retive no final deste espectacular mergulho.
Minutos depois ascendiamos á superficie, tendo ainda tempo de contemplar cardumes de Bicudas e Xaréus a nadarem no azul limpido, cristalino, de um tom azul claro, único e indescritivel.


Naufrágio do "Dori"

Seria o ultimo mergulho nas aguas de S. Miguel…pelo menos desta vez.
A saida foi combinada para as 14 horas e teriamos ainda uma viagem de barco de quase 45 minutos.
Pela primeira vez, o barco era ocupado na totalidade por mergulhadores Portugueses. Carlos Viñader e Isabel Hervás, o simpatico casal Espanhol com quem tinha partilhado as ultimas imersões não nos acompanhariam desta vez.
Ao chegar no local onde fundeámos o barco, via-se antes de entrar na agua a sombra do naufrágio no fundo. Reconhecia-se também uma enorme mancha em movimento constante por baixo do barco. Segundos depois tinhamos a confirmação do pessoal que entrava na agua de que se tratava de um cardume de centenas de Xaréus que se deslocavam na zona, por cima do destroço. Os setenta metros de comprimento fazem com que seja quase impossivel uma unica visita ao local. Os mais de quarenta anos em que se encontra no fundo, sujeito aos rigores do mar Açoreano, fazem com que a popa seja ainda o local em que a estrutura esteja menos danificada, tombada para estibordo com uma das helices ainda com as pás completamente visiveis.
A profundidade oscila entre os 12 metros e os 20 metros e as várias partes do naufragio estão quase que completamente forradas por espirografos.
Os guias seriam mais uma vez o Carlos Paulos e o Nélio Santos, cada um com um grupo e que nos levariam por um passeio espectacular por entre as várias partes que se encontram na popa.
Distinguem-se ainda guindastes e equipamento de carga do navio, dois enormes reservatótios colocados lado a lado. No fundo de areia, Salmonetes de vários tamanhos vasculham constantemente o fundo.
Além do interesse em olhar nos esconderijos formados pelo ferro e que escondem cardumes de várias especies, temos de estar tambem com atenção ao azul e ao que nos vai passando por cima. Há sempre grandes surpresas como a enorme ( e aqui enorme é mesmo...enorme !!!) Barracuda solitária que curiosa com a nossa presença resolveu aproximar-se e investigar aquele grupo de estranhos seres.
A passagem pelo hélice é obrigatoria e nesse local encontramo-nos na parte mais funda do mergulho.
Acompanhado pelo Pedro Veiga, que tinha chegado aos Açores vindo do Algarve, fomos demorando o tempo, fazendo por aproveitar cada segundo do nosso mergulho.
A temperatura agradavel da agua, a visibilidade excelente e motivos q.b. para fotografar, contribuiram para tornar este mergulho num dos melhores mergulho em nafrágio que já realizei.
Consegue-se sentir o silencio e a calma emanada pelo local, sendo apenas interrompido pela nossa respiração pausada e cadenciada.
Na subida, todo o grupo se juntou no cabo permitindo uma visão espectacular de mergulhadores tendo como tela de fundo os restos do cargueiro perfeitamente visiveis agora em toda a sua extensão e até onde a vista alcançava.
Já mesmo no final do mergulho, somos "invadidos" pelo cardume de Xareus visto no inicio.
Envolvem-nos e rodopiam de forma compacta.
Das ultimas visões que retenho deste mergulho, é o Nélio e outro companheiro a seguirem o cardume completamente envoltos na nuvem de peixe.
Eu, infelizmente, já não tinha ar para mais tempo.


Terminava assim os mergulhos que efectuei em S. Miguel.
Muito mais do que um paraiso subaquatico, que permite mergulhos inesqueciveis e variados, é tambem fundamental conhecer a ilha na sua totalidade. Vale cada centimetro conhecido.
Por mim, ficarei para sempre rendido a todas as belezas que encontrei.
Quanto aos companheiros e Centro de Mergulho, acredito que dificilmente encontrarei quem, com o seu profissionalismo e dedicação, consiga encarar melhor o verdadeiro Espirito Azul…
Açores…até breve !
















terça-feira, 8 de julho de 2008

O inicio...

Sinceramente não sei como começar...
Começo por justificar a criação deste espaço ? É uma ideia...
Começo por escrever porquê o interesse e porque é que gosto de mergulhar ? A resposta é talvez demasiado obvia, depois de se experimentar a sensação de estar submerso e observar tudo em nosso redor é impossivel não gostar... o interesse e o querer saber mais vêm depois, naturalmente, como em qualquer actividade que gostamos.
Porquê o mergulho e não outra actividade ? O gosto e respeito pela Natureza, o querer conhecer novos espaços, a novidade e inacessibilidade a muita gente, o silencio e a sensação de "estar submerso" são talvez as principais razões.
Este espaço vem na sequencia da vontade de partilhar as histórias e os momentos que sinto nesse maravilhoso mundo do silencio.
Não sou escritor nem fotografo, não faço pretensões disso.
Apenas vou aqui deixando testemunho das recordações que trago e que quero partilhar.
Aquilo que me deixaria feliz ? Saber que o testemunho que aqui deixo servirá como motivação e interesse para quem nunca experimentou o mergulho autonomo arranjar alguma coragem adicional para o fazer e assim, haver cada vez mais interesse e vontade na prática efectiva da actividade, sendo no final mais uns "soldados" na preservação dos nossos Oceanos e da vida marinha.
Aqui deixarei também o meu agradecimento a todos aqueles com quem tenho partilhado esses momentos unicos.
Do pessoal dos Centros de Mergulho aos buddies de ocasião, passando pelas amizades solidas que tenho ganho, todas são importantes e tentarei não as esquecer.
No fundo, depois do mergulho ter terminado, do material arrumado e á espera de nova opurtunidade, são os amigos que ficam e com quem partilhamos os melhores momentos vividos pouco tempo antes.