sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Menorca, Reserva da Biosfera




















Tinham chegado as merecidas férias...
Depois de procurar, ver condições, alojamentos e de um ano de trabalho, é sempre com enorme ansiedade que chegamos naquela data em que queremos mandar tudo "ás urtigas", fechar á chave o dia-a -dia e pelo menos esquecermo-nos que os problemas existem mas vão ficar adiados por algum tempo.

Tinha chegado esse dia !
Malas e bagagens feitas e arrancámos para Menorca. Durante uma semana estavamos de férias !!
Tinhamos escolhido ficar no Norte, em Playas de Fornells. Local pacato, bastante sossegado mesmo numa ilha que está apinhada de turistas e de hoteis.
Do hotel conseguiamos ver toda a baia, extensa com o mar calmo e sereno, de cor azul clara ladeada de arribas não muito altas. Ao fundo o farol de Cap de Cavaleria faria-nos companhia todas as noites com a sua luz brilhante e periódica, indicando a quem passa por ali ao largo os perigos e a localização da formação rochosa.
Todas as noites, ao jantar no hotel, conseguiamos assistir a um por do sol que desaparecia á nossa frente, fazendo quase um ritual diário para todos os presentes ficar a admirar as cores e a calma transmitida pelo fogo do sol, em contraste com um mar brilhante e um céu a fazer de ligação com todo aquele espectaculo.
Já começava a gostar da escolha feita !
Para mais, a zona de Fornells fica incluída na Reserva Norte de Menorca, o que para uns mergulhos é sinónimo de qualidade em variedade e quantidade de vida a encontrar.
Mal podia esperar pelo primeiro.

Primeiro mergulho, Costa Sul. "Malakoff".
Levámos o barco até Calla Galdana, a cerca de 20 minutos de Fornells na costa Sul.
O grupo era constituido por 6 pessoas, um casal muito simpático de Barcelona, mais um Espanhol, eu e o meu buddy de ocasião, Ulrich de seu nome, Alemão, que estava alojado no mesmo hotel, mais o dono do Centro de Mergulho, Thierry Garrigue, de origem francesa mas que vive em Menorca á mais de 25 anos.
Todos extremamente simpáticos e comunicativos o que permitiu uma grande empatia entre todos.
O Thierry seria o skipper do barco, o Ricardo seria o guia, ambos com grande experiencia e conhecimento do local.
O mar estava completamente parado, apesar de ter amanhecido com algumas nuvens sentia-se o calor já a convidar a um belo mergulho.
O "Malakoff" é um naufragio, situado a Sudoeste da ilha, a cerca de 20 minutos de barco e a poucas milhas da costa.
Afundou no inicio de Janeiro de 1929, supõe-se que devido a erro de navegação, quando da viagem de regresso de Madagascar e Reunião tendo como destino o porto de Marselha.
Segundo descrições da epoca, a noite estava escura e cerrada devido ao nevoeiro fazendo confundir a rota em dois pontos determinantes.
O cargueiro de 7000 toneladas estava agora junto á torre de Artrutx com um desvio na rota de algumas milhas.
Ao bater forte numa baixa submersa, começa a afundar rápidamente não dando sequer hipotese de usar todos os meios de socorro disponiveis.
Um dos 9 sobreviventes, o capitão do barco na confusão que se gerou e rapidez de afundamento, não consegue sequer precisar a localização do barco afundado sendo localizado por pescadores de Calla En Turqueta mais tarde nesse dia enquanto procuravam no meio dos destroços por sobreviventes.
O "Malakoff" jaz desde esse dia no fundo a 40 metros e cerca de 1 milha a Sul da baia de Calla Turqueta, arrastou com ele a vida de 26 tripulantes e 2 mulheres ( esposa do capitão e do maquinista ).
O fundo em redor do naufrágio é areia branca o que permite com as visibilidades habituais, vislumbrar quase da superficie a totalidade do destroço.
Mar extremamente calmo, ausencia quase por completo de correntes e agua de uma limpidez incrivel, são as condições encontradas ao chegarmos ao local.
O Thierry ferra o barco, dá-nos um briefing rápido, focando especialmente os riscos e cuidados a ter pela profundidade a que vamos mergulhar.
A partir daí estamos por nossa conta e por conta do guia Ricardo !
A descida é impressionante.
Eu e o Ulrich paramos a cerca de 15 metros onde conseguiamos ter uma visão geral dos mais de 100 metros de destroço que tinhamos por baixo dos nossos olhos. É uma visão arrebatadora e que nos dá ainda mais vontade de chegar ao fundo.


Ali, conseguimos combinar o percurso que pretendemos. Descida pelo cabo, direcção á proa ( ou o pouco que resta dela), virar a estibordo do navio, dirigirmo-nos para o meio onde o porão está completamente destruido e permite ver alguma carga...e se houver tempo : direcção popa. A subida nesse caso terá de ser sem cabo com as nossas boias.
Foi a primeira vez que planeei uma imersão com o "modelo" real á disposição...e á vista.
Chegados ao fundo, onde já os nossos restantes companheiros se encontravam entretidos do lado de estibordo com uma enorme lagosta, deparamo-nos com uma bela moreia pintada, tentando passar despercebida num ferro em forma de L . O que me chamou mais a atenção nesta moreia foi o padrão de pintas amarelas.
Achei-o diferente das moreias pintadas que já vi, tanto em individuos maiores como menores.
Nestas ocasiões normalmente as maquinas fotográficas tambem não colaboram...
Não há muito tempo a perder, a imagem ficará gravada na memória apenas.
Prosseguimos para junto dos restantes elementos que pretendem descer mais um pouco e separamo-nos. Os 3 elementos descem por estibordo, eu e o Ulrich dirigimo-nos para o meio do navio, onde se encontram ferros e mais ferros retorcidos, ao alto, na horizontal, de todos os tamanhos, sempre patrulhados por cardumes de centenas de barracudas que circulam por entre eles e nos observam a uma distancia consideravel.
Algumas mais curiosas aproximam-se para se voltarem a juntar ao cardume após se assustarem ou perderem o interesse por aqueles seres estranhos que por ali passeiam.
















A barracuda é a rainha do local !! Os cardumes são enormes e estão presentes em qualquer local do naufragio.
A nossa viagem continua com muito pouco tempo disponivel e resolvemos deixar a popa para outra imersão.
Dirigimo-nos então na direcção do cabo que estará a mais de 50 metros do local onde estamos, com calma e aproveitando cada segundo.
Observamos as antias residentes no fundo, ás dezenas, que se confundem com as castanhetas em maior numero.
Já perto do final do tempo disponivel e perto do cabo, na nossa frente estão 6 meros, todos de médio porte, mas muito timidos e que não permitem aproximações. Imagem incrivel !! É ali que acabamos com o pouco tempo restante, com os computadores a apitar, o ar a desaparecer, resolvemos começar a subir lentamente no azul a ver cada vez mais longe o naufragio, passando a ser uma sombra no fundo.
Aos 12 metros passam por nós, no limite da visibilidade, possivelmente atuns, pequenos em grupo e a uma velocidade elevada.Quase que nem nos apercebemos da sua passagem por só conseguirmos vislumbrar sombras rápidas em movimento.
Estamos numa termoclina de 26º de temperatura o que tambem não ajuda a visão e compreensão do que vimos.Senti-me derreter dentro do meu "semi-seco para aguas Atlanticas" de 6,5mm.



















Dentro em breve estaria o mergulho terminado...e valeu cada segundo !!
Foi um mergulho espectacular a todos os niveis.
Pela quantidade de vida encontrada, principalmente as barracudas e os meros, pelas condições quase ideais num naufrágio com tanto para ver, pelas saudades obvias que deixa e fazer nascer o desejo de voltar.

Foi espectacular saber e falar sobre o barco, sobre o mergulho, com pessoas que tão bem conhecem o local e a história, "honrando" também mais uma das tradições do Centro de Mergulho...
A primeira rodada foi minha...

5 comentários:

Nitrox disse...

Belo mergulho! Pena não termos locais com essas visibilidades no continente. Ainda anseio por sair do rectângulo para fazer uns mergulhos, até lá vou contentando-me a ler relatos como este teu.

Fica Bem!

Ricardo disse...

Belo blogue, parabéns!

Já estás "linkado" nos meus...

diario de mergulho disse...

Obrigado !!

As visibilidades que tive a sorte de encontrar são de facto impressionantes. E segundo os "entendidos" ainda não eram assim tão boas ( nunca encontrei menos de 30 metros !!!) porque em Junho os fundos ficam cobertos com posidónia (http://pt.wikipedia.org/wiki/Posidonia_oceanica, fundamental para a vida e diversividade marinha, mas que prejudica a visibilidade e nalguns casos até o proprio mergulho. O melhor mês é Agosto. Visibilidades perto dos 40 metros e agua normalmente a 24º C...
Em Junho se não der para mergulhar, não há problema : as praias estão cheias de turistas Italianas e o Xoriguer ( bebida local, do genero do Gin ) faz maravilhas :-) !!

Que saudades de Menorca...

Luis Miguens disse...

Viva Pedro.

Quando é que no Skaphandrus.com poderemos contar com algumas das suas fotografias de naufrágios?

Um abraço.
Luis Miguens

diario de mergulho disse...

Olá Luis Miguens

Eu sei que estou em falta com o Skaphandrus.com...
Falta de tempo, principalmente.
Eu não sou fotografo e as fotos que tiro nunca me deixam satisfeito com o resultado.
Gosto mais de pesquisar e de escrever sobre naufrágios( apesar de também não me considerar escritor), de uma forma muita amadora.
O exemplo podes ver aqui, com o Hildbrand e com o Malakoff.
Mas há mais...
Com o tempo vai aparecendo.
Se tudo correr bem, no inicio do ano vai sair um novo artigo na Planeta sobre um naufrágio bastante conhecido e interessante.

Um abraço